Kaplan-Meier: Estudos Clínicos do Coração

Durante quase dois anos eu coordenei uma equipe de Analytics e BI, custos assistenciais em saúde e Epidemiologia. Neste período realizamos dezenas de trabalhos e projetos. Conheci profissionais fantásticos e tive acesso a informação e tecnologias que mudaram minha vida.

Nessa jornada, conheci o médico Rafael Mariano. Cardiologista, Infectologista, Epidemiologista, Intensivista e Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade Federal de Santa Catarina. Um cara fora de série e apaixonado por estatística. Tive o prazer de tê-lo na minha equipe como Epidemiologista. Estudamos e analisamos muitos dados juntos.

Um dos estudos rendeu um prêmio de 2° colocado no 21° Congresso Internacional Unidas, que aconteceu na Costa do Sauípe, Bahia, em 2018.

Resolvi compartilhar o paper submetido para que você possa ter acesso a mais uma aplicação da estatística. Um caso onde usamos técnicas de Análise Não Paramétrica.

Vai na fé! O texto é técnico, mas vale a pena a leitura. Essa é uma aplicação estatística que pode salvar vidas.


Introdução

Estima-se que um terço dos pacientes diagnosticados com Estenose Aórtica (EA) sejam inoperáveis devido a idade elevada ou presença de comorbidades (SPONGA et al., 2017). Nestes casos, o Implante de Bioprótese Aórtica Transcateter (TAVI) tem sido apontada intervenção de escolha. A cada ano, ocorrem cerca de 18.000 (dezoito mil) novos candidatos para o TAVI em países da Europa e em torno de 9.200 (nove mil e duzentos) na América do Norte, com um custo de mais de 2 (dois) bilhões de dólares por ano (OSNABRUGGE et al., 2013). No Brasil, devido ao custo elevado, a utilização da TAVI tem sido objeto de judicialização.

Justificativa

A análise de custo efetividade pode orientar gestores e médicos na escolha do melhor procedimento terapêutico na EA grave inoperável. Esta técnica busca preservar o acesso ao procedimento mais indicado, sem comprometer a sustentação econômica do sistema de saúde.

Objetivo

O objetivo deste trabalho foi analisar a Razão de Custo Efetividade (RCE) do TAVI em um plano privado de assistência à saúde com abrangência estadual em Santa Catarina.

Método

Trata-se de estudo de coorte retrospectiva. As informações foram obtidas do sistema de contas médicas de uma empresa de Gestão em Planos de Saúde. Foram incluídos todos os pacientes submetidos ao TAVI no período de janeiro de 2012 a dezembro de 2017. A RCE foi calculada pelo quociente entre o custo do procedimento e o tempo de sobrevida. O custo foi calculado pela soma do custo da prótese e do honorário médico cirúrgico. Os valores foram corrigidos para janeiro de 2018. A sobrevida foi calculada pelo Método de Kaplan-Meier.

Resultados / Discussão

Durante o período de estudo, 279.480 clientes fizeram parte do plano de saúde. Destes, 15 foram submetidos ao TAVI (5,37 casos / 100.000 clientes), sendo oito homens (53,3%) e sete mulheres (46,7%). A média de idade dos pacientes submetidos ao TAVI foi de 82,05 ± 7,85 anos. Foram excluídos quatro casos devido a dados incompletos no sistema. Durante o período de observação, quatro (26,7%) pacientes foram à óbito. O custo do procedimento foi de R$ 96.726,86 ± R$ 14.772,80 e a mediana da sobrevida 1,99 anos (IC 95%: 0,64 a 3,34 anos). A RCE foi R$ 48.606,46 por ano de sobrevida.

O TAVI foi pouco custo efetivo na população estudada porque seu custo por ano de sobrevida foi 1,54 vezes maior que o PIB per capita brasileiro em 2017. É possível que o extremo de idade dos pacientes (82,05 ± 7,85 anos) tenha interferido neste resultado. Os autores sugerem que, para pacientes com expectativa de vida menor que dois anos, como aqueles com idade acima de 80 anos, sejam considerados procedimentos com menor RCE, como a Valvotomia Aórtica com Balão.

Referências

OSNABRUGGE, R. L. J.; KAPPETEIN, A. P.; REYNOLDS, M. R.; COHEN, D. J. Cost-effectiveness of transcatheter valvular interventions: economic challenges. Euro Intervention, v. 9, n. Suppl, p. S48-S54, 2013.

PERIN, M. A.; BRITO JÚNIOR, F. S.; ALMEIDA, B. O.; PEREIRA, M. A. M.; ABIZAID, A.; TARASOUTCHI, F.; GRUBE, E. Substituição valvar aórtica percutânea para o tratamento da estenose aórtica: experiência inicial no Brasil. Arq Bras Cardiol, v. 93, n. 3, p. 299-306, 2009.

SPONGA, S.; ISOLA, M.; BAGUR, R.; TORRACCHI, L.; MAZZARO, E.; GRILLO, M. T.; LECHIANCOLE, A.; POMPEI, E.; ARMELLINI, I.; LIVI, U. Transcatheter aortic valve implantation versus surgical aortic valve replacement in patients over 85 years old. Interactive Cardiovascular and Thoracic Surgery, v. 25, n. 4, p. 526-532, 2017.


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* As análises foram realizadas no SPSS.

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